2/10/2007

Mais vale tarde que nunca

Interrompo hoje as minhas obras de Santa Engrácia.
Arriscando-me a ser presa ;-) , e porque me foi totalmente impossível fazê-lo antes, venho publicar a minha opinião sobre O Assunto em pleno período de reflexão, pretendendo obviamente com isso influenciar o sentido do voto dos meus estimados inúmeros e incontáveis ;-)
Provavelmente quando muitos dos meus inúmeros e incontáveis chegar a ler esta piquena reflexão, já a decisão estará tomada, mas espero pelo menos influenciar dois de vós e assim mudar o curso da história de Portugal ;-)

Os inúmeros e incontáveis que me conhecem sabem muito bem o que penso acerca dO Assunto, mas, para que não fiquem dúvidas e não vá aparecer algum forasteiro (bem vindo sejas, oh tu que nunca antes houveras escancarado as portas deste humilde estaminé!...), começo por dizer alto e bom som que vou votar SIM no referendo de amanhã. Se esta intenção de voto ofender algum dos inúmeros e incontáveis, escusais de continuar a ler estas parcas linhas: podeis carregar no quadradinho do lado superior direito do ecrã e voltar noutro dia – ou, quiçá, não voltar, dependendo do tamanho da vossa ofensa. Digo isto apenas para evitar ter de apagar algum comentário pouco inteligente (ou até, eventualmente, responder-lhe, o que muito me incomodaria, dada a minha falta de tempo – e de pachorra!) ou que venha a chocar-me, a mim, Calamity, ou a algum dos meus inúmeros e incontáveis. Sou uma mecinha simples, porém sensível e certas atitudes deixam-me deveras ultrajada na minha forma de estar na vida.

Infelizmente deverei contar entre estas últimas alguns dos argumentos utilizados pelos defensores do ‘não’ que considero de tamanha má fé que seriam até capazes de me fazer mudar de ideias caso alguma vez tivesse estado indecisa ou porventura tivesse alvitrado votar de outra maneira que não aquela que já referi e que é uma decisão irrefutável, a não ser que alguma catástrofe natural ou qualquer evento altamente incapacitante me impedisse de prosseguir com o meu intento. Aliás devo dizer que entre a minha decisão de votar ‘sim’ amanhã e a de uma mulher que decida fazer um aborto existe uma semelhança incontestável: a impossibilidade de alguém nos fazer mudar de ideias, uma vez que esta decisão foi de tal forma pensada, reflectida, pesada e examinada em todos os seus aspectos que não existe qualquer forma de a alterar.

Mas vamos então ao que me traz aqui. Há oito anos atrás quando outro referendo semelhante levou uns quantos eleitores às urnas enquanto outros preferiam ir a banhos convencidos que a opinião deles não faria a diferença, num exercício de anticidadania e de irresponsabilidade inenarráveis, convenci-me de que tudo tinha sido dito e que a má-fé e a desonestidade intelectual tinham atingido os mais altos píncaros e logo seria impossível igualá-los. Enganei-me. Devo admitir que estas qualidades conseguem sempre superar-se e, como tal, nas últimas duas semanas consegui ouvir, ler e ver argumentos, discursos e formas de actuação que ultrapassam todos os limites do aceitável. Passo a enumerar alguns – e faço-o tão só para manifestar o meu espanto, desagrado e revolta e também porque penso que serviram apenas para reforçar as intenções dos que votam ‘sim’ e para esclarecer alguns indecisos, levando-os a decidir no mesmo sentido. Quero ainda dizer que escolhi só alguns dos mais incríveis por entre os que ouvi, até porque a maior parte dos outros foram de tal modo esgrimidos em programas de televisão, conversas de café, filas de supermercado, blogues e múltiplas outras publicações online e em papel que não há absolutamente necessidade alguma de continuar a chover no molhado.

1 – Dez semanas. Um feto de 10 semanas já chucha no dedo (!!!); um feto de 10 semanas já sente dor (!!!!!!!!!!); um feto de 10 semanas isto, um feto de 10 semanas aquilo; um feto de 10 semanas, pelo que sei, até já escreve à mãe. E de além-tumba. Ou caixote do lixo, ou lá o que é.
Pois bem, meus senhores. Eu já estive grávida de 10 semanas. E até fiz uma ecografia às 9 semanas e meia (que data sugestiva, não acham?!). E tenho a dizer o seguinte:
a) um feto (que nessa altura para muitos cientista e médicos é ainda tão só um embrião) de nove semanas e meia mede apenas cerca de 23 mm (o meu media, duvido que o das outras meça muito mais…). Ou seja, pouco mais que dois centímetros. Como podem então alguns senhores ( e senhoras!) andar a passear um boneco a que deram o nome de Zézinho (!!!!!) querendo fazer crer os transeuntes mais crédulos e incautos que se trata de uma réplica de um feto de 10 semanas?! Acaso o embrião/feto cresce desmesuradamente em apenas 3 dias e meio? E mesmo que digam que se trata de uma réplica absurdamente aumentada, vejam bem até que ponto lhe modificaram o aspeco em relação ao verdadeiro aspecto de um embrião/feto de 10 semanas. Acaso julgam que somos todos parvos?
b) Por que raio é que uma mulher que decida abortar depois de a lei ser aprovada decide fazê-lo no último dia do prazo legal? Acham realmente que se trata de um assunto para deixar para a última da hora tipo entrega da declaração do IRS? Estão a gozar comigo? Ou com quem? Dez semanas significa para a maioria das mulheres mais do que dois atrasos sucessivos. E querem fazer-nos crer que uma mulher que decide abortar não o faz assim que descobre estar grávida? Vai ficar à espera de quê? De curtir uns enjôozitos? De sentir os pontapés? Tipo: “ah, e tal, eu estou grávida e decidi fazer um aborto, mas já que posso fazê-lo até às 10 semanas e ainda estou de seis, vou ali de férias pró avançado da relote em S. João da Caparica e trato do assunto quando voltar e o mê Zé for trabalhar. Assim comássim ainda tenho quatro semanitas pela frente… fico a curtir uma dietazita, uns gregórios, e tal…”. Por favor! Não me lixem, está bem?

2 – A carta. Tipo: “Não falei contigo por medo que os montes e vales que me achas…” ai não, enganei-me, não era isto. Era: “Mandei-lhe uma carta em papel perfumado e com letra bonita…”. Ai, enganei-me outra vez. A ver se acerto desta vez. “Querida mãe, querido pai, então que tal?...”. Eh pá, desculpem lá. A única forma que encontro de me referir a ESTE NOJO é a brincar. A sério não consigo. Não consigo, a sério. A coisa é de tal forma grave que penso sinceramente que os autores deste CRIME deviam ser presos preventivamente e posteriormente julgados e condenados por ofensas graves à integridade moral dos pais daquelas crianças e por maus-tratos aos miúdos. Eu retirava os meus filhos daquela escola. E processava-os. E sobre isto não quero falar mais – que até me tira o sentido de humor.

3 – A baixa natalidade em Portugal e na Europa. É o argumento mais baixo, pobre de espírito, ridículo, aviltante e desonesto que ouvi nos últimos anos. Só ultrapassado pela grandiosa calinada do genial Santana Lopes quando comparou o governo dele a um bebé na incubadora que levava estalos dos irmãos (lembram-se?).
Então aquelas benzocas horrorosas que tratam os filhos por você num exercício decadente de duvidoso amor materno querem povoar o envelhecido continente com os frutos forçados das gravidezes indesejadas das desgraçadas deste país? Querem mais recém-nascidos abandonados nas maternidades? Mais mortos em sacos de plástico metidos nos contentores do lixo? Mais putos menores a vaguear pelas ruas de saco de cola em riste ou encostados à estátua do Cutileiro à espera do cliente que lhe dará 5 ou 10 euros para comprar um panfleto de pó na Meia-Laranja? A encher os lares da Santa Casa e da Segurança Social quando todos sabemos que apenas 5 por cento deles virão um dia a ser adoptados (só isto vale vários posts que serão publicados oportunamente)? A boiar no Douro? Numa pocilga algarvia a servir de ração aos porcos? Numa ruína abandonada a espancar por divertimento um travesti sem-abrigo até à morte?

4 - Quem? Quem? Quem autorizou aquelas avantesmas a utilizar o poema da Florbela Espanca para a sua campanha? A quem pertencem os direitos de autor? Com que legitimidade colocam “Amar Perdidamente” num catrapázio gigantesco em plena Praça de Espanha? (E, quem sabe; noutros locais do país?) Não há ninguém que ponha ordem nisto???

5 – Eu sei que muitos dos defensores do ‘não’ de hoje são os mesmos que ontem se levantavam contra o planeamento familiar e a contracepção. E hoje vêm defendê-los com unhas e dentes. É bem, não digo que não. Só os estúpidos não mudam de ideias. Mas digam-me lá uma coisa. Se a vida começa na fecundação, então nenhuma delas usa D.I.U., presumo eu. Ou será que usam? E saberão elas como funciona o dito dispositivo? Ah, pois é!...

Last but not the least. Como dizia a Helena Roseta: eu não sou uma criminosa!
Vou votar SIM amanhã. Quem ainda achar algo para dizer que atire a primeira pedra.

10 comentários:

. disse...

:) Olha já está decidido! Não vi motivos para festejar, no entanto. E também não havia necessidade de outras pérolas, como "agora é que vai ser" e "os portugueses vão ter agora uma saúde digna". O Louçã tb foi particularmente infeliz ao dizer que agora estamos a apanhar o ritmo da Europa. Credo. Mas afinal o que aconteceu ontem em Portugal? Por momentos ainda pensei que as maternidades iam reabrir, as urgências não iam fechar, a Saúde ia ser 100% gratuita para todos, os recibos verdes iam acabar, os salários iam aumentar e as mulheres iam ficar obcecadas com os métodos contraceptivos. Uma espécie de NUNCA MÁS" (vou engravidar se não quiser), em versão portuguesa. Mas, afinal, não. Afinal estavam a falar de uma qq campanha eleitoral (como lhe chamou o Miguel Macedo, do PSD, em pleno directo). Só não ouvi buzinas na rua, vá lá. Tb só faltava essa. E eu que tenho de mim para mim que as mulheres que mais precisavam desta medida, não foram votar.

Desculpa CJ. Já se sabe que sou descrente. Mas estou aqui para engolir, palavra por palavra, se for caso disso, já que expressei o benefício da dúvida no papelinho de Domingo. Tb sei um argumento esquisito para o Sim. "O aborto existe e existe, portanto é uma questão de arranjar melhores condições para o fazer". Ok... Há muita coisa que "existe e existe"... e não quer dizer que a despenalizemos. Coragem, mulheres. Que esta mudança (atrasada) nos traga mudanças boas, a vários níveis.

Anónimo disse...

CJ,
O que me amachuca o espírito é o teu preâmbulo, e tu achas (naquele teu comentário) que já ouvi dizer que semelhante espécie ainda "pode" ganhar o concurso? É motivo para emigrar!! Não?, está bem, temos que ter calma … pronto, está bem. Loool.

Estou esperançada, não sabes porquê? Porque alguém vai ter que determinar a idade do feto, um médico, logo, mude o que mudar, a mulher não está sozinha como até aqui, clandestinamente…

Só uma questão que acho que te devo dizer: Não acho bem que fales das pocilgas do Algarve! Isso é mais para os lados do Alentejo! No nosso Algarve temos é fábricas de farinha de peixe, e não pocilgas. Olha que é uma grande diferença! Loooll

Queres melhor dia para reflectires, do que o dia da reflexão?

Beijinhos

AEnima disse...

obviamente nao vim atirar a primeira pedra... antes o primeiro aplauso.

Ja se venceu uma pequenina batalha minuscula... vamos partir para a proxima... essa dos lares da misericordia parece-me muito bem!

(olha, nao achas uma ganda lata destes partidos de direita vir apregoar a obrigacao do estado em apoiar e assim e assado se quando eles vao para o governo, a primeira coisa que fazem eh retirar apoios do estado sempre aos mais "pequenos"? - Nao eh por nada, mas cada vez gosto mais deste PM, parece-me ainda ter alguma fibra numa conjuntura politica de vermes e minhocas)

Quita disse...

Cj. concordo plenamente contigo, esta campanha chocou-me profundamente!! Foi demais... Acima de tudo foi politica e acredito que não era esse o objectivo.

125_azul disse...

Tu és uma mecinha simples e eu sou uma à beira de um ataque de nervos! É a terceira vez que tento deixar um comentário e agora já vem a destempo! Se desta não ficar, desisto!Texto fantástico, de qualquer maneira!
Combinamos o tal almoço? Apresento o Miguel à malta e agradeço pessoalmente os miminhos que me tens deixado lá no 125!
Beijinhos

RB disse...

um beijo enorme para ti, de saudades

Ck in UK disse...

Acho que te consegui ver e ouvir nesse ultimo Ah pois e! :-)

tens toda a razao, more

beijos

Ck in UK disse...

Acho que te consegui ver e ouvir nesse ultimo Ah pois e! :-)

tens toda a razao, more

beijos

Ck in UK disse...

Acho que te consegui ver e ouvir nesse ultimo Ah pois e! :-)

tens toda a razao, more

beijos

L de Luis disse...

Vê lá mas é se as terminas de vez.