Tenho a mania de olhar para o outro lado. De querer saber o que está para lá. Na imagem refllectida pelo espelho, tudo está invertido. A esquerda passa a ser direita e esta vira canhota. Cortar o próprio cabelo é de loucos: a tesoura teima em ir na direcção contrária à pretendida e, se tentarmos aparar a franja, por pouco não furamos o olho. Falo por mim, claro.
Mas eu tenho a mania de querer saber o que está do outro lado. E, neste caso que ficou conhecido como sendo "da bebé de Penafiel", tenho-me fartado de pensar e o meu coração fica apertadinho a cada vez que me lembro desta miúda com poucas semanas menos que a minha canuca. Não está em causa a gravidade da acção que aquela senhora cometeu. Sempre me interroguei sobre que tipo de loucura poderá levar uma mulher a entrar numa maternidade e levar um bebé que não pariu. Que não carregou, que não sentiu crescer em si. Deixar uma outra mulher num desespero inigualável, inimaginável.
Mas neste caso, algumas variáveis entram em linha de conta, desde o primeiro instante em que se soube que uma recém-nascida tinha desaparecido do hospital. E eu lembro-me muito bem, até porque tinha uma nos braços, com escassas seis semanas. A estória mexeu comigo, como não podia deixar de ser. Só quem já foi mãe sabe como estas coisas mexem connosco quando temos as hormonas aos saltos, em total desassossego. Lembro-me de ter achado estranhíssimo que uma mulher acabadinha de dar à luz largasse o seu bebé no quarto para ir jantar ao refeitório. Claro que só posso falar por mim, mas, das duas vezes em que tive um bebé, não os largava sozinhos no quarto nem para ir à casa de banho. Ou, se fosse, deixava a porta aberta e mijava na beirinha da sanita, pronta a saltar que nem uma leoa sobre qualquer intruso que se atrevesse a aproximar da minha cria. Bem sei que não somos todos iguais e eu talvez não seja o melhor exemplo. Admito que sou algo paranóica. Não me apanham à espera do metro na beirinha do cais. Eu sei lá, há tanta gente louca! Mas voltando à bebé de Penafiel, desde o princípio achei os contornos da estória no mínimo bizarros. Uma mãe muito pouco desesperada. Dois filhos já retirados à família. O tal jantar no refeitório. E depois, bom, depois lá foi passando o tempo e nada. De vez em quando lembrava-me do assunto, mas confesso que na minha cabeça nunca mais encontrariam a miúda. Mas enganava-me. A miúda apareceu. Estava viva, de boa saúde e bem cuidada, ao que parece. Tinha duas irmãs e um irmão. Um pai e uma mãe. Sim, eu sei que aquela mulher a retirou do hospital e não poderia ficar com ela, até porque cometeu um crime terrível. Mas, e a miúda? Para já não falar daquele homem, que viveu durante pelo menos um ano com quatro filhos e de repente se vê só com um. Para não falar daquelas crianças que viveram todas juntas durante pelo menos uma ano. Mas, e a miúda? Tudo o que ela sempre conheceu estava ali, naquela família. Por mais que fosse um embuste. Olho para a minha menina e só me dá vontade de chorar. Como iria ela reagir se algum dia a tirassem bruscamente do ambiente que ela sempre teve como seu? Se a afastassem de uma vez só de todos os seres que formam o seu pequeno mundo? Toda a gente se lembrou de falar de vinculação em relação à Esmeralda, mas não ouvi ninguém pronunciar-se sobre a menina de Penafiel. É assim tão diferente? Porquê, alguém me explica? Ou aqui já não é o "superior interesse da criança que está em jogo"? Porque não se falou sequer em transição gradual? Porque não se permitiu à criança que fizesse um afastamento progressivo da restante família afectiva (uma expressão tão em voga), já que a mãe raptora (mas igualmente afectiva, para todos os efeitos, e choque isto quem chocar) teria obrigatoriamente de ser afastada na hora? E uma aproximação progressiva à família biológica? Que, diga-se de passagem, e desculpem-me a franqueza, não me parecia assim tão desesperada por reaver a sua criança. E, por falar nisso, o que é feito das outras duas, aquelas que lhes tinham sido retiradas? Demonstraram eles vontade de as ter com eles?
Estarei a delirar? Ou haveria outra maneira de fazer? Estará este caso a tantos anos-luz assim do de Torres Novas? Ou será a distância mais pequena ainda do que a quilométrica? Por que não ouço ninguém falar das consequências terríveis que o "regresso" (não é regresso nenhum, uma vez que ela nunca lá esteve, por assim dizer) à família biológica poderão acarretar para esta menina?
PS: À Aenima, CK, Rute e talvez mais uma ou duas das minhas queridas companheiras (mas agora não me lembro quais são) deste tasco que é a blogosfera que não consigo comentar, uma beijoca saudosa. Aenima, escreveste um post com o qual não poderia identificar-me mais. Acho que não preciso de te dizer qual foi...
CK, babe, como vai essa anca?
3/19/2007
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12 comentários:
Pois, isto não é linear, e é evidente que não há soluções brilhantes. No entanto, concordo em absoluto que o assunto foi tratado de forma redutora, e muitas questões ficaram por responder, ou, pior ainda, foram "respondidas" por clichés que nada resolvem, e que não traduzem qualquer verdade indiscutível. É importante, de facto, chamar a atenção para isto, e levantar questões.
Gostei muito do blog, por aquilo que li. Tenciono dedicar-lhe alguma atenção, nos tempos mais próximos. Talvez venha a tornar-se mais uma das minhas paragens obrigatórias.
Olá Calamity
Sabes que me assaltam exactamente as mesmas questões que tu puseste neste post. Tal como tu tenho um filhote 6 semanas mais novo que a Andreia. Lembro-me na altura ter estranhado toda a história. Eu que nunca perdia (perco) de vista o Martim um segundo, com medo que um louco qualquer o leve, não consigo perceber como é que aquela mãe foi jantar e deixou a filha recem nascida sozinha. Parecia que estava mesmo a permitir a ocasião ao ladrão... Ela que já tinha duas filhas entregues a outra pessoa por ter sido negligente com a saúde delas. Tudo isto me fez imensa impressão.
E agora que a menina apareceu não consigo deixar de pensar naquele pai que de repente deixou de ter uma filha, daquelas duas irmãs que ficaram sem pai nem mãe, enfim.
Se se devia manter a Andreia na família que a viu crescer durante um ano, acho que não, pois era abrir um precedente muito grave. O que se devia ter feito era um período de transição muito mais longo e continuar a permitir contacto entre os falsos pai e irmãos com a pequenita.
Desculpa o testamento
Beijinhos
Amiga, estou de acordo com umas coisas, mas n c outras... aqui vai:
1. A mãe só a deixou sozinha pq pensava q era seguro;
2. Conheces-me, certo? Sabes como sou c o Zézinho, certo? Qtas vezes já me disseste q tinha de o deixar voar? Sabes q o deixei sozinho no berçário qd fazia fototerapia, pq já n aguentava mais o cansaço e precisava de dormir? Sim, é verdade e pq confiava ser seguro. E eles (bebés) no berçario ficavam mtas vezes sozinh, sem enfermeiras, nem ninguém a vigiar... e tu conheces o berçário do HSFX. A sra tinha feito uma cesariana há 2 dias, mandaram-na ir jantar ao refeitório... se calhar, até lhe era fisicamente doloroso andar c a bebé. Deixou-a pq achava ser seguro.
3. Sim, a história tb me tocou mto, pq o Zézinho tb só tinha um mês na altura... mas, espoecialmente, pq a 1ª notícia q li dava logo a entender q a culpa era da mãe, pq a tinha deixado sozinha, ou q esta estaria envolvida, pq era pobre e já tinha mtos filhos.
4. Sinceramente, tb tenho pena da raptora... é a prova de q alguém q aparentemente até nem é má pessoa pode c um acto tresloucado "estragar" a vida a tanta gente... mas deixar a criança c ela seria o mm q dizer q o crime compensa. significaria q, se te roubassem um filho, bastava passarem algum tempo c/ ele p/ q a ele tivessem direito.
5. E se fosse connosco? Se te tivessem gamado a calamytizinha qd estavas no recobro? Ou a minha miniatura enqto estava na fototerapia? Não querias ter a tua menina de volta? Não?
6. Sinceramente, tenho pena de tds nesta história. a sério q tenho. Chego a pensar uma vez por hora (eu sei q parece estranho, mas sou assim) nesta miúda.... se estará bem, se se adaptará, etc... colo os problemas e as vidas dos outros, smp fui assim...
bj*
Então vou introduzir outras variáveis ainda. A mulher não parecia desesperada, é certo. Independentemente de toda a conjuntura, e se ela estivesse desesperada por reaver a criança, isso faria alguma diferença? Então e se me raptassem o filho a mim, ou a ti, CJ? Deixavas que, por superior interesse da criança, a demente que te roubou o filho ficasse com ele/ela umas horinhas por dia? Pois. É complicado responder. Há muitas variáveis, como bem dizes. Eu estava mais a imaginar-me a partir-lhe a tromba, sem dó nem piedade. Mas como não estamos a falar de nós, falemos da Andreia Elisabete. A meu ver, o rapto foi ó uma forma de olharmos para tantas Andreias Elisabetes deste país. Se ela tivesse ido para casa naquele dia, ninguém saberia, ninguém se interessaria, e a miúda por lá ia ficar, até que uma qq Comissão de Protecção ou Segurança Social, decidisse se ela havia de ser retirada dos pais ou não.
Parece-me que se a mãe quisesse, podia muito bem tê-la dado para adopção. Ainda pode fazê-lo. Qtos de nós tb não pensamos o mesmo que a Judiciária? Vendeu-a. Ou autorizou a raptora a levá-la, dando-lhe uma desejável folga no tempo de almoço. Pensámos sim. Pensamos nisso pela ausência de choro, de desespero, de tudo. Mas não nos compete a nós decidir qual o futuro melhor para ela. Desculpa discordar, a discordar tb se fazem amores, mas o caso do Sargento tem pouco a ver com isto. Um ano não são cinco. O sargento e a mulher receberam, inicialmente, uma dádiva, não a roubaram. Depois tentaram mantê-la, o que é compreensível. Não se dá e tira uma pessoa, a bel prazer, e esperar que o deserdado aceite de ânimo leve. Apetecia-me muito citar a loira qdo disse:
"Perante os pais da Andreia eu até posso ser rica, mas perante um Belmiro de Azevedo dou pobre. Se ele me gamasse o Zézinho deveria ficar com ele só pq teria oportunidade de supostamente lhe dar uma vida melhor???"
Os comentários da Loira e da Luz disseram tudo. Para mim não há comparação entre os dois casos, 1 ano não são 5, uma deu a filha a outra foi-lhe retirada à força... Ambos as crianças estavam bem tratadas, felizmente, mas a mãe da Esmeralda escolheu dar e a quem dar a filha...
Nem imagino perder a minha filha e ainda ser acusada de a ter vendido... Se eu tivesse 6 ou 7 filhos também não poderia viver com grandes condições mas nem por isso se ama menos!!
Eu cá sofro com estes casos... o q me vale é q o meu caminho de casa é longo, posso chorar tudo e, como é autoestrada, ninguém vê.
Eu concordo com tudo o q disseste e tb com o q a loira e a luz acrescentaram.
Não consigo é de deixar de ter pena da menia, não consigo...
Bom, minhas queridas Loira, Estrelinha e Mamã p: talvez não me tenha exprimido bem ou talvez as meninas não me tenham entendido em toda a dimensão do meu pensamento (gostaram??!). Eu comecei por "condenar" o acto tresloucado de uma mulher que foi capaz de levar um bebé que não pariu. Dificilmente consigo imaginar momentos de pior horror para uma mãe, mas também para toda a família do que o desaparecimento de um filho, seja ele recém-nascido ou não. É um pesadelo só de pensar. Para além do mais nunca defendi que a criança ficasse com ela. Apenas que a transição de com a restante família (que não tem culpa nenhuma do acto dela - e até prova em contrário o ignorava por completo - inclusivamente a principal interessada, a menina) fosse feita de outra forma. Manifestei a minha preocupação com o "pai", "irmão" e "irmãs", e sobretudo com a menina.
A minha comparação com o caso do Sargento assenta em vários pontos:
1º - o aparente desinteresse/desapego da família biológica. (E desculpem-me as/os que não concordem mas a mãe biológica da Esmeralda tb o manifestou, por mais dificuldades que estivesse a passar. Alguma de vocês "entregaria" o seu filho? Além disso resta saber se o entregou mesmo de forma assim tão desinteressada. Essa é a "estória" que nos venderam;
2º - Um ou cinco anos, na óptica da criança, não é o mesmo, mas a verdade é que a vinculação está feita. E neste caso desde uma idade ainda mais precoce, o que a torna mais sólida. Para além do mais, a verdade é que o caso Esmeralda atingiu os 5 anos devido à permanente recusa da família afectiva em entregá-la. Concorde-se ou não que ela seja entregue ao pai biológico, a verdade é que há anos que a sua tutela foi atribuída a este último.
3ºface a tudo isto, apenas me faz impressão que (aparentemente) ninguém se preocupe com a transição de uma família para outra só porque a menina foi parar à família que conhece como sua de uma forma (ainda ) menos legítima (sim, porque a outra forma tb foi pouco legítima - e, acreditem, inúmeros e incontáveis, se há pessoa que levantou a voz em defesa da manutenção da menina na família "afectiva", essa pessoa fui eu). Mas isso, a meu ver, não retira um milímetro nem um grama de preocupação em relação à menina. A ela e só ela.
Se fosse eu... Claro: se fosse eu ia querer partir-lhe a tromba. Ia querer matá-la. Ia querer a minha menina já.
Mas talvez - e digo mesmo, e sublinho TALVEZ - pensasse depois um pouco no tal "superior interesse da criança" e em tudo o que disse neste post e neste comentário e mantenho. E TALVEZ, devido à minha gigantesca paranóia e excesso de zelo fosse particularmente difícil levarem um bebé meu da maternidade. TALVEZ - a não ser que me drogassem. E bem.
Não venho comentar, até porque já o fiz. Quero apenas agradecer a tua visita, e prestar um esclarecimento. As crónicas da mesa 19, que me deste o prazer de visitar, são compreensiveis só por si, mas fundam-se num núcleo existente de pessoas. Para quem não almoça lá, nem acompanhou as descrições desde a primeira crónica (e já são 80), alguns aspectos podem parecer mais obscuros.
Tenho outro blog mais antigo, independente de mesas ou grupos, onde escrevo, exclusivamente, aquilo que me vai passando pela cabeça. Tem textos divertidos, espero que tenha também alguns inteligentes, outros deprimentes, e mais uns quantos, que são apenas argumentos que eu venho preparando antecipadamente, tendo em vista uma futura reforma por razões psiquiátricas. Se quiseres dar uma vista de olhos, fica em http://sepulcro.blogs.sapo.pt/
Por último, li vários dos teus posts, mais os respectivos comentários, e vi-me assaltado por uma dúvida: será que estou aqui, por engano, num blog só de amazonas, tipo "menino não entra", para o qual estarei hormonalmente desqualificado? É que não me queria de facto intrometer, juro.
Um abraço,
Nuno
Não, Nuno, este não é um blog exclusivamente para mulheres. Antes pelo contrário, já apelei várias vezes a que mais homens de entre os meus "inúmeros e incontáveis" leitores se pronunciassem, mas são raros os que o fazem; excepção feita ao meu mui fiel Anjo Mau - que de Anjo tem muito e de Mau muito pouco (eheheh) - os restantes, se é que os há, nem vê-los. Por essas e por outras (e outros...), és muitíssimo bem vindo! Só um aviso, já q ainda não me conheces: sou uma blogueira fiel, mas pouco assídua. e tb conto reformar-me um dia destes pelos mesmos motivos q tu. Espero q nessa altura não me cortem o pio: é q por vezes falo um pouco alto demais... ;-)
complicado? muito... ouvi o eduardo sá falar sobre este assunto e dizia ele: como se pode devolver uma criança a uns pais que foram considerados inaptos para tratar de outras crianças? como se pode devolver uma criança a uns pais que poderiam ver as filhas deixadas com cerca de 5/6 anos em encontros na paroquia, devidamente combinados aos quais eles nunca apareceram?
Não entendo... compreendo que seja crime, sem duvida e que a criança seja retirada à raptora, mas depois? como se soluciona o resto???
gaita para o pais que apenas valoriza a familia biológica à em vez da propria criança!
Um beijo com saudades, e já vi que conseguinte comentar!!!
Ola more, ca ando. a anca ja ta ok. o resto e q nem por isso...
beijo gde
ps - mudaste de casa?
oh, que pena... porque sera que nao consegues? ate esta livre para anonimos!
E sim... acho k sei de qual falas. Mil beijinhos!
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