6/21/2006

Neuróticos somos todos

Uns mais, outros menos; ou talvez uns dêem mais largas às suas neuroses do que outros, mas a verdade é que a cada um a sua panca e felizmente que assim é porque no fundo são também estas “pequenas coisas” que nos tornam únicos e ao mesmo tempo normais. Não deixamos de sentir um certo alívio ao reconhecermos que os outros também as têm, semelhantes às nossas e ao mesmo tempo tão específicas. Uns morrem de medo de andar de avião e outros não se metem no metropolitano por nada deste mundo. Uns não conseguiriam dormir se tivessem deixado os bibelôs desalinhados na prateleira, outros não conseguem manter nada em ordem, mesmo que se esforcem muito para isso. Há quem não consiga sair de casa sem verificar n vezes se o gás ficou fechado ou volte repetidamente atrás para ver se deu realmente quatro voltas à chave na fechadura. Há quem tenha de comprar dúzias de coisas absolutamente inúteis a cada vez que entra numa loja chinesa e quem faça o mesmo em estabelecimentos bem mais caros.
Tudo isto, dentro do rol das nossas pequenas neuroses, é “normal”. Todos temos um pouco de obsessivo-compulsivo, todos temos variações de humor - sobretudo nós, meninas, graças às nossas bem conhecidas hormonas – sem que isso faça de nós maníaco-depressivos. Sim, é verdade que a fronteira entre a “normalidade” e a “loucura” ou o “desvio” é uma linha tão ténue que por vezes não sabemos bem como situar certos comportamentos, pensamentos ou sentimentos. Por mim falo, obviamente, mas sei que não sou a única a questionar-se sobre estes assuntos. Talvez por isso sempre fui “atraída” pelas questões da doença mental. O que é? Como podemos determinar o que é “normal” e o que é “patológico”? Se eu “perder a razão”, será que me vou aperceber?
Entre o que é considerado um indivíduo mentalmente “são”, ou seja, saudavelmente neurótico, e as desordens graves do foro mental, como as psicoses, esquizofrenias, etc, há as chamadas personalidades borderline. Poder-se-ia dizer que são pessoas que vivem sempre “no fio da navalha”. Elas e os que vivem em torno delas. Os borderline fazem parte de uma “categoria” de perturbações que a psiquiatria não consegue “arrumar” na “prateleira” das neuroses, porque são francamente mais “destrambelhados” que a maior parte dos “neuróticos normais”, mas que também não chegam a apresentar um perfil verdadeiramente psicótico. O transtorno de personalidade borderline faz parte de um conjunto que vai do histrionismo à perturbação ansiosa, da personalide paronóide à perturbação esquizóide. Muitos destes distúrbios implicam uma enorme dose de agressividade/hostilidade para com os outros, o que afecta particularmente os mais próximos, com grande incidência nas famílias. Muitas vezes, as “crises” são cíclicas e todos os que vivem com aquela pessoa confrontam-se diariamente com a recordação da mais recente e com a expectiva da próxima. À espera de quando ele (ou ela) se vai passar novamente. A recear esse momento. Porque frequentemente estas pessoas não reconhecem o problema que têm – ou só o reconhecem nos períodos de acalmia - e, obviamente, recusam o tratamento –ou interrompem-no ao menor sinal de melhoria, piorando logo em seguida -, é extenuante viver com elas. Em muitos casos, existem consumos de drogas e sobretudo de álcool – essa droga dura legal e sempre minimizada por grande parte da sociedade que tantos estragos faz (mas sobre esse assunto falarei noutro dia, que dá posta das grandes) – , o que ainda torna a situação mais difícil. E porque essas pessoas têm, quase sempre, dupla personalidade, quem (con)vive com elas tem relutância em desistir delas. Porque o “outro lado” é por vezes muito diferente. Sedutor. Bom.
Mas quem está próximo também acaba por ficar afectado. Doente. Porque a doença mental é tão contagiosa como qualquer virose, acabando por minar toda a família. As pessoas em volta nunca sabem. Nunca sabem se podem dizer o que vão dizer. Se podem fazer o que vão fazer. Se a acção mais inocente, mais inconsciente não se vai virar contra elas. Tudo tem de ser medido, cuidado. A espontaneidade, a impulsividade não podem sobreviver. Nem a frescura, a inocência, ou a sanidade. Pois são autênticos vampiros emocionais. Especialistas na manipulação, na projecção ("eu não estou doente, tu é que estás"), na chantagem emocional.
Na minha vida já me cruzei com vários “casos” destes. Pessoas que conheci, com quem me dei, com quem vivi, convivi, de quem gostei, que amei, que deixei, pessoas que se foram, que voltaram, que ficaram, que já lá vão. Às vezes interrogo-me por que motivo me confronto tão insistentemente com este lado da vida, com este aspecto da pessoa humana. E, como sou profundamente neurótica (ou quem sabe talvez para lá disso), sofro. Por mim, por elas, pelo que são, pelo que foram, pelo que fizeram, deixaram de fazer, poderiam ter feito. Pela marca profunda que deixam em todos quantos cruzam o seu caminho. Mesmo quando dizemos BASTA.

15 comentários:

Loira disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Loira disse...

Olha, escrevi um comentário e apaguei...
Beijinho... cá estou para o que precisares: omeninodamama@hotmail.com

Ck in UK disse...

Tenho umas coisas serias a dizer por este assunto, mas sao privadas. Tens email?

Cool Mum disse...

Não te procupes que acho que vamos todas ignorar... força

Mae Frenética disse...

Sim, tens email?
Podes ir ao meu blog e encontrar lá o meu, se preferires.

matamari disse...

Olá!
Desculpa ter feito parte de uma coisa que não queria, mesmo acidentalmente. Comentei por que o assunto não me é deconhecido, nem indiferente...
Diz-me se quiseres falar, desabafar, mandar vir, seja o que for...
Podemos arranjar maneira de trocar mails ou falar ao telf., sem que isso se torne público...
Se quiseres, até lá, ou até sempre, muita força!

Caracoleta disse...

Acho que compreendo um pouco porque me compreendes!
Beijo

RB disse...

Que força de post, que ira contagiante. Que dor que carregas...
Que o sol venha depressa...
um beijo

. disse...

Algo se me escapa. Mas pronto, na ignorância, vou comentar. Os Transtornos Obsesssivo- Compulsivos são-me familiares. A minha paranóia com o 11, bem mais calma agora, é um bom exemplo desse desequilíbrio que nos pode afectar a todos. O Borderline, confesso, já tinha ouvido falar, mas nunca liguei muito. A fronteira entre o aceitável e a demência é de facto uma linhita de nylon. A normalidade é um conceito muito frágil. Toda a gente tem destroços e cacos para apenhar. Uma das coisas que me assusta mais é passar "para o lado de lá", sem me dar conta. Acho que o ser humano consegue aguentar muita coisa, se mantiver uma certa força psíquica. Qdo isso se perde, até as pequenas pedras nos parecem gigantescas e inultrapassáveis escarpas.

Anónimo disse...

DIZEM QUE SOU LOUCO POR PENSAR ASSIM... MAIS LOUCO É QUEM ME DIZ E NÃO É FELIZ... NÃO É FELIZ (NEY MATTO GROSSO)
PARA TI QUE ME ENSINASTE QUE DEVIA APRENDER A VIVER COM A MINHA LOUCURA E SER FELIZ.
AMO-TE MUITO SOBRETUDO PELAS NEUROSES TÃO HUMANAS.
GUIDA(MECO)

Smas disse...

Eu tenho a mania das listas e hoje falo sobre isso no meu post, mas a mim ajudam-me imenso.
Bjs

Zuza disse...

;)

. disse...

Onde estás tu minha Calamity Jane?? :(

gnoveva disse...

:)

Anónimo disse...

Gostaria de, à guiza de comentário, explicar para vocês o que nos leva a ser vítimas de vampiros emocionais.
Por ser filho de pais portugueses no Brasil, pouco dados às manifestações emocionais dos filhos que eram duramente criticadas, fui reprimindo minhas emoções e me envergonhando delas desde a infância, até chegar ao ponto de temê-las.

Já na fase adulta, qualquer pessoa que descrevesse um fato passado e suas emoções sentidas ou imaginadas eu, de imediato sentia como se aquelas emoções fossem minhas e que aquela pessoa era minha melhor amiga pois no passado tinha conseguido me fazer feliz.

Por mais que a pessoa fosse desonesta, malandra ou sem-vergonha, ela logo caía em minhas boas graças e eu até emprestava dinheiro para ela.

Felizmente, não adotei as técnias de vampiragem que minha família adotou.

Consegui desenvolver a crença de que eu poderia comprar tudo com dinheiro e por esse motivo, sempre estudei e trabalhei, usando minhas carências afetivas para ganhar cada vez mais dinheiro, a fim de comprar as pessoas que me faziam me sentir bem, seja em relação ao passado seja em relação às suas fantasias que encontravam eco em meu inconsciente infantil.

Depois de tanto quebrar a cara e não conseguindo entender o que estava errado comigo, procurei um psicólogo que me ajudou a ver as minhas fraquezas bem como minha própria atitude vampiresca, igualzinha à de minha família que eu tanto criticava.

Afinal, eles queriam tudo e não davam nada em troca.

Eu, pelo menos, dava dinheiro.

Hoje, após ter tomado consciência desse processo, e olha que já fazem 8 anos desde que comecei a me interessar por isso, sinto-me liberto dessa compulsão e digo "não" à todo mundo, sem um pingo de arrependimento pois sei que as pessoas não tem nada a me oferecer pois o que eu preciso eu compro e aquilo que não tem preço eu conquisto com minha simpatia e boa-educação.

Por isso, uma recomendação para quem quer se libertar desse tipo de gente é aquela frase "Conhece-te a ti mesmo".

Aprenda a reconhecer seus sentimentos negativos tais como ciúmes, inveja, raiva, medo, etc. no momento em que eles se manifestam em seu físico.

Com isso, identificando-os e sentindo como eles são, a sua mente será capaz de criar soluções para os mesmos e, inclusive, lembrar das situações originais que os reforçaram em sua psique.

Para isso, a meditação onde a pessoa se coloca em contato consigo mesma e, através da imaginação, evoca cenas que lhe provocam aqueles sentimentos, é uma boa terapia para não se deixar mais se levar por esses sentimentos.

Os monges budistas são portadores de uma serenidade invejável, mas quando estão em meditação sofrem horrores, evocando em si as emoções mais baixas que um ser-humano pode sentir.

Só que eles optaram pela não-ação em função desses sentimentos.

Abraços e espero ter ajudado a desmistificar a figura desses indivíduos que nada mais são do que carentes afetivos incapazes de se darem aquilo que lhes falta por não terem consciência clara daquilo que lhes está faltando.