11/26/2008

Ainda não são as nomeações mas paciência que elas vêm a caminho

Lembra-me o blogger-tubarão que ontem foi Dia Internacional pela Eliminação da violência contra as Mulheres e, embora pense que este é um assunto do qual deveríamos falar todos os dias, assim como da violência contra todos os seres - pelo menos enquanto esta não for totalmente erradicada -, fico com vontade de partilhar com os inúmeros e incontáveis uma posta ou melhor, meia-posta, que 'roubei' a um tasco que partilho com outras comensais. Quer dizer, trata-se de um roubo tipo Margarida Rebelo Pinto. Mas não é um autoplágio, já que me autocito e deixo as referências. Ao menos na blogosfera posso fazer o que quiser com as minhas postas, à diferença do que sucede em certos meios onde determinados meninos e meninas - não sei que outro nome lhes pôr - se acham no direito de dispor dos meus textos como bem entendem, retendo-os indefinidamente nas suas gavetas, impedindo-os de ver a luz que toda a palavra escrita merece e a mim de receber do meu trabalho o respectivo fruto mas isso são outros quinhentos sobre os quais noutra altura e quiçá noutro local se falará. E a vocês, inúmeros e incontáveis em geral, não caberá a carapuça, digo eu de que porque a bem dizer nunca se sabe quem anda por aí. Se porventura o recadinho tocar alguma campaínha, pois que a Calamity é boa mecinha e está (ainda) aberta ao diálogo até ao dia em que resolver de facto dar aos respectivos textos o caminho que lhes pertence e que definitivamente não é a escuridão nem o esquecimento. Pois já estou crescidinha para castigos sobretudo por parte de quem nem sabe o que significa ser pai ou mãe e muito menos depender do número de páginas publicadas para obter ou não obter o sustento da família, i.e, viver sujeito à arbitrariedade dos humores alheios. Enfim, tudo isto para dizer que como sou dona dos meus textos, publico-os onde bem entender. E sem mais demoras aqui fica a meia-posta que há tempos deixei ao molho no tasco das comadres. E desculpem-me os inúmeros e incontáveis que porventura já tivessem tropeçado na dita posta no supracitado tasco.

(...) apeteceu-me falar-vos da minha amiga Maria. Maria é nome fictício, não que alguém a fosse reconhecer se eu pussesse aqui o nome dela mas enfim, será talvez deformação profissional.

A Maria talvez ficasse espantada se passasse por aqui e percebesse que eu não engoli a história que ela me contou quando eu -ingénua! - lhe perguntei o motivo pelo qual tinha uma nódoa negra no osso da bochecha e outra no bíceps do lado oposto (fora as outras, as que não vi e as que não mencionei). Que o meu coração se apertou e ficou pequenininho à medida que acenava e fingia estar a visualizá-la descalça a escorregar no chão molhado da cozinha e a cair NAQUELA posição. Contra todas as leis da física. E o quanto me doeu perceber que ela insistia na versão coxa dos acontecimentos, acrescentando pormenores que a tornavam de todo inconcebível - é que, apesar de pouco provável é possível dar de trombas numa porta semi-aberta, assim como é possível cair-nos uma prateira de livros em cima ou levarmos com o espelho do retrovisor lateral esquerdo de um automóvel em cheio na sobrancelha direita como me aconteceu há uns anos. Mas, e desculpa-me, Maria, não entra na cabeça de ninguém que tenhas caído para a frente nas circunstâncias que referiste. Porém, tenho sobretudo é de pedir-te desculpa pela MINHA falta de frontalidade pois fui incapaz de te confrontar. Eu sei que o momento não era adequado, porque havia mais gente à volta, mas devia, eu sei, ter-te chamado à razão, devia, eu sei, ter trazido o assunto de novo à baila assim que me apanhasse sozinha contigo, dar-te a ocasião de falar, de desabafar, embora esteja cá desconfiada que não o irias fazer.
Logo tu, a mulher independente, liberta e forte que és. Logo tu, que nunca precisaste de um homem para nada. Logo tu, que estás a anos-luz dele em termos intelectuais, culturais, espirituais e até mesmo financeiros. Logo tu, que és dona da casa onde ELE mora. Que és mãe da filha em quem ele se acha no direito de mandar. Que ele se acha no direito de castrar, obrigando-a comer, forçando-a a fazê-lo em silêncio, tal como certamente o fizeram com ele quando era miúdo, tornando-o no tipo retrógrado, limitado e agressivo que é hoje.
Não irias dizer-me a verdade porque isso seria dar-me razão. Porque sabes o que penso, não que to tenha dito. Porque me dirias o mesmo e por muito menos. Sem nunca admitir. Dizendo que ele é sim senhora um gajo por vezes bruto mas nunca levantaria um dedo para te magoar a ti ou a ela, pois se ele até é tão porreiro que até tem o jantar pronto quando chegas a casa mais tarde.
Quero que saibas, gostaria que soubesses que podes fraquejar ao pé de mim. Que podes chorar, berrar. Que escusas de afixar essa felicidade falsa. Que não precisas de falar sem parar para que não sobre espaço nem tempo para o que dói, para o que realmente interessa, para o que verdadeiramente importa. Que não te irei condenar nem achar menos de ti. Embora continue a achar que não precisas disso. E tu sabe-lo tão bem. Difícil é só dar o primeiro passo. E tu sabe-lo tão bem...

12 comentários:

Luz de Estrelas disse...

Ó CJ... :( Infinitamente triste. Ambos os papéis. Ela a disfarçar o indisfarçável, tu a fingires que acreditaste. Não a podes confrontar... por escrito que flui melhor? Mas porque é que as pessoas se prestam a isto? Por amor? Mas amor a quê? A um ideal de marido, que só existe aí mesmo, no plano dos sonhos?

Carlota disse...

CJ.
CJ soa incrivelmente bem, como é que não me ocorreu antes?
E faz-me lembrar a CJ do The West Wing, que era a porta-voz da Casa Branca, sabes?

Pois, mas CJ, o que interessa agora referir é que guardarem os teus textos na gaveta é uma injustiça. E também uma forma de violência que, obviamente, tem de acabar!

M disse...

tb já tinha lido lá no outro estaminé...é infinitamente triste, cm diz a luz....tristeza maior só o saber q n é o único caso....tristeza ainda maior é saber q ontem, qd andaram a distribuir kits sobre a violencia doméstica (nada de bastões ou gás pimenta, só uma braçadeira, um autocolante e coisas do género) eram mais os homens a aceitar q as mulheres, q fugiam....

bj meu

Rita Camões disse...

Glup, a impotencia que se sente por não poder fazer nada, e aquele sentimento que nos invade constantemente, " se fosse eu, se fosse comigo". Mas a verdade é que ninguém sabe o que se passa na cabeça de uma mulher que consegue tolerar uma coisa dessas.

Tita Dom disse...

Sem abertura é impossível a mudança da postura, não basta haver o dia Internacional pela Eliminação da violência contra as Mulheres, falta-lhes apoios psicológicos, que as façam virar a mesa para deixarem de ser dependentes, vulneráveis, submissas…. É preciso a tal abertura. Sem ela ninguém ajudará…
Mantém o teu ombro presente, ás vezes basta-lhe isso.
Bjs

shark disse...

A única vez que estive perto de matar outro ser humano aconteceu na sequência do espancamento de uma mulher por parte do coirão que tinha em casa.
Sorte a dela, já tombada no chão e sem reagir, calhou eu ouvir-lhe os gemidos e apertar o pescoço à besta até mudar (muito) de cor.
Felizmente houve quem me apertasse o meu para evitar o pior.
Estas histórias que quase toda a gente tem para contar têm mesmo que acabar e isso passa pela linha dura judicial como passa pelo fim do "perdão" da sociedade para com esses "maus momentos" dos cobardes que os protagonizam.
Desculpem o tom radical, mas eu conheço a realidade de perto e não apenas nas casas de outros.

shark disse...

Conheço esta realidade, queria eu dizer.

calamity jane disse...

Estrelinha, pode ser q um dia se proporcione. Não é bem amor. Será talvez um medo não assumido de ficarem sós. E neste caso tão somente isso. Noutros, outras dependências, mais complicadas...

Carlota: CJ, ainda não tinhas notado que metade das minhas inúmeras me chamam assim? Aliás, trata-se das meninas dos primórdios daquela q costumo chamar "a minha blogosfera". Curioso seres a única (até agora) a comentar a outra questão. Sim, uma violência q só acabará no dia em que eu conquistar, fora dos blogs, a independência editorial q tenho neles. Utopia? Talvez, mas tenho de acreditar :-)

Monikyta, seja como for é bom saber q havia homens a aceitá-los e que cada vez é maior o barulho em torno do assunto

Rita, dentro da cabeça delas vai algo deste género: querer desculpar o seu homem porque se quer acreditar q foi uma fraqueza, um devaneio; querer acreditar q foi a última vez; querer acreditar q não foi tão grave assim.

Sorrisos, neste caso não há falta de apoios nem depedência pelo menos daquela de que falas. São outras vulnerabilidades. Não tens aqui uma mulher submissa nem impotente, tens aqui uma mulher com todas as armas do seu lado só que decidiu não lutar. Até ao dia

Sabes, Shark, acredito que esta realidade, como muitas outras q não cabe estar a enumerar aqui (mas posso citar assim só de repente as dependências de drogas e álcool)são muito mais familiares a muito mais gente do que a generalidade das pessoas quer admitir. Fez sentido esta minha frase meio arrevezada?

beijos a todos

Lina disse...

Venho cá muitas vezes mas não costumo comentar.
Neste post e, como mulher, achei que devia.
Se ainda manténs contacto com essa MULHER, não desistas desse confronto. Na hora certa pode fazer toda a diferença. Quem sabe, ela não aguarda apenas por uma mão.
Bj. Triste.

Carlota disse...

Claro que tinha reparado!!!
Nunca tinha era lido CJ em inglês. E isso faz toooda a diferença!

AEnima disse...

Linda,

Fico com pena de saber-te com tanto texto no fundo da gaveta. Imagino que os motivos sejam de simples "inviabilidade financeira"... com outras pessoas mais amigas das detentoras da gaveta a serem casos mais "viaveis".

Fico com mais pena ainda que pessoas como a Maria nao se apercebam que tu tens uma qualidade especial de veres as pessoas para alem dos olhos... e lhe conheceres o fundo para alem das palavras ou modas.

Mas suponho que partilhar a sua dor seja enfraquecer a sua personalidade. Tornar-se menos valida e alvo de pena. Esconder doura a pilula.

Nao sei do que falo. E' melhor calar-me.

Anónimo disse...

Cj referes-te a violência doméstica (agora um tema tão actual e tão na moda)??? Hummm! - não houve sempre a dita cuja? - e
porquê vivenciar tantos dias, meses e anos num clima familiar tão degradante?
Masoquismo?... ou estupidez?
...diz-me tu.